Avaliação imobiliária – que futuro?

Luis Cura • 21 de setembro de 2022

Como é que conseguiremos adaptar uma geração com décadas de experiência em avaliação residencial, a encarar e preparar-se para outro tipo de avaliações? Não nos enganemos – nem todos irão permanecer na atividade.

As avaliações para o setor financeiro constituem na maior parte dos Países a principal fatia do mercado de avaliações e Portugal não é exceção. 


Com pouco mais de 2.000 profissionais a operar no setor das avaliações, cerca de dois terços dos avaliadores imobiliários desenvolvem atividade para o setor financeiro, muitos em exclusividade. Não obstante a entrada de duas ou três centenas de novos avaliadores imobiliários no mercado, nos últimos 5 anos, a realidade é que grande parte do universo de avaliadores já passou os 40 anos e pertence a uma geração formada ainda no final do séc. XX. 


A estes torna-se mais difícil a passagem para uma nova realidade, onde a atividade necessita de recorrer cada vez mais à tecnologia para ganhar eficiências que permitam rentabilidade, num universo onde os honorários estão estagnados há anos ou atualizam-se timidamente, não acompanhando a subida de outros custos essenciais para a atividade, como o combustível, as portagens, etc. 


O virar da segunda década deste milénio coloca aos avaliadores imobiliários o desafio mais importante de todos – existirá futuro? 

A implementação das novas tecnologias nesta atividade vinha em crescendo até 2019, existindo cada vez mais soluções de software disponíveis para a avaliação imobiliária. Neste grupo de novo software começavam a aparecer algumas soluções de AVM (Automated Valuation Methods), na sua maioria ainda ajustadas apenas à realidade de outros Países, como Espanha e pouco sensíveis ao mercado Português, com raras exceções. 


A pandemia de Covid 19 veio, no entanto, alterar este paradigma e de um momento para outro, uma maior dificuldade na realização das inspeções aos imóveis, decorrente das restrições pandémicas, criou uma oportunidade para o aparecimento de novas empresas tecnológicas, com core business centrado na construção de megabases de dados de asking price e introdução de algoritmos de análise de dados para construção de AVM. 


Na sua maioria, essas soluções estão ainda longe de garantir fiabilidade, agravado pelo facto de Portugal ser um País de fraca transparência no que diz respeito ao acesso à informação sobre as transações de imóveis, o que nos mantém na dark age do mundo da avaliação, ou seja, naquele grupo dos que realizam avaliações baseadas quase exclusivamente em amostras de mercado de asking price.


No entanto, as tecnologias estão aí, existem e já estão a ser utilizadas por alguns bancos para a realização das avaliações obrigatórias decorrentes do Acordo de Basileia II, por exemplo. São milhares as avaliações que já deixaram de ser realizadas por avaliadores e que ficam sujeitas a mecanismos de inteligência artificial, mais ou menos “inteligentes”. 


A pressão para que este tipo de tecnologia seja aceite nas avaliações do sector residencial sente-se um pouco por toda a Europa, estando inclusive incorporada na proposta de alteração ao Regulamento dos Requisitos de Capital dos Bancos (CRR) que a UE irá publicar durante o próximo ano e será apenas uma questão de tempo, até que outro Estado sucumba à pressão e tentação, como já aconteceu há uns anos com a Holanda. Sendo talvez o mais liberal dos Estados, não será de estranhar que tenha sido o pioneiro nos chamados stand alone AVM, mas essa onda acabará por chegar a outros Países mais conservadores, como é o caso de Portugal. 


Não faz sentido lutar contra o avanço tecnológico. Ele existe e o setor da avaliação imobiliária não será exceção ao seu desenvolvimento. No entanto, será importante que, em Portugal, como noutros Países, se preparem os avaliadores para esta realidade incontornável e se aceitem os AVM, mas como um produto nunca desligado da intervenção dos avaliadores imobiliários. 


A sensibilidade e a experiência de um avaliador imobiliário dificilmente serão substituídas por uma máquina, pelo que qualquer modelo de AVM não deverá estar desligado da intervenção do avaliador, até mesmo para o manter calibrado e com eficácia. No entanto, e, não obstante ser claro que os stand alone AVM não constituem uma solução credível para a avaliação imobiliária, a penetração dos AVM no mercado será incontornável e mesmo mantendo a ligação obrigatória aos avaliadores imobiliários, a tecnologia irá substituir muitos deles. Isso deixará grande parte dos avaliadores imobiliários, nomeadamente os que estão muito focados no mercado residencial, a necessitar de reconversão para outras áreas da avaliação. 


É aqui que surge o segundo grande desafio à atividade. Como é que conseguiremos adaptar uma geração com décadas de experiência em avaliação residencial, a encarar e preparar-se para outro tipo de avaliações?


Não nos enganemos – nem todos irão permanecer na atividade. Os que se especializaram ao longo de anos no setor residencial, terão de se adaptar aos outros setores de avaliação e terão de ganhar competências que lhes permitam realizar avaliações mais complexas, como terrenos com potencial de construção, edifícios de comércio e serviços, avaliação de negócios e empresas, entre outros. 

E é também aqui que entra um conceito fundamental para o futuro de qualquer avaliador imobiliário da segunda década do séc. XXI – visão. É preciso visão para perceber que os tempos estão a mudar muito rapidamente e que, em poucos anos, esta realidade não será uma pura suposição. 


Assim, um avaliador que pretenda permanecer mais uns bons anos nesta atividade terá de se adaptar, de se formar e de evoluir. A acreditação profissional, nomeadamente o REV/TEGOVA, é um dos caminhos nesse trajeto de evolução, mas não é o único. É preciso apostar em formação e aí as associações de avaliadores têm um papel fundamental. É ponto assente que a formação terá cada vez mais importância no futuro dos avaliadores imobiliários. Aqueles que não apostarem na formação contínua e diversificada terão muita dificuldade em permanecer no mercado. 


É certo que os avaliadores imobiliários se debatem com alguns problemas, sendo a questão dos baixos honorários transversal à grande maioria dos Países da Europa. No entanto, é preciso sair rapidamente do estado letárgico do “desgraçado mal remunerado” e procurar novas soluções e novos posicionamentos no mercado, que garantam melhores rentabilidades. É obrigatório que os avaliadores constatem uma realidade que só esperavam daqui a 5 ou 10 anos, mas que a pandemia acelerou. 


Será apenas uma questão de tempo para que as entidades financeiras, na busca incessante de reduzir custos, integrem em larga escala as novas tecnologias e ganhem a tentação de substituir gradualmente os avaliadores imobiliários do setor residencial. E dai será um pequeno passo para convencer os decisores políticos e reguladores da bondade e eficácia de tais tecnologias. 


Cabe aos avaliadores imobiliários estarem um passo à frente desta realidade que parece cada vez mais incontornável e prepararem-se para integrar o grupo dos que se adaptaram, dos que ficarão. Aqueles que não o fizerem, serão aquilo que no processo evolutivo se designa pelos inadaptados, os que o processo de seleção excluirá naturalmente do futuro.

FONTE: visão



LCC - Luís Cura Consulting


Luis Cura

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